Antontem ficámos a saber que João Bravo, um dos capitalistas reacionários que há anos financia o Chega, foi constituído arguido no chamado cartel dos helicópteros. É só uma parte dos seus negócios. A maior parte está concentrada no reforço do aparelho repressivo do Estado: menos Estado social, mais Estado penal, lá está.
sábado, 31 de maio de 2025
Tudo ligado
Antontem ficámos a saber que João Bravo, um dos capitalistas reacionários que há anos financia o Chega, foi constituído arguido no chamado cartel dos helicópteros. É só uma parte dos seus negócios. A maior parte está concentrada no reforço do aparelho repressivo do Estado: menos Estado social, mais Estado penal, lá está.
sexta-feira, 30 de maio de 2025
Momento Heinrich Brüning?
Usando de uma possibilidade que resultou da convocação inesperada de eleições antecipadas, com cinismo e mediana argúcia tática, a Aliança Democrática (AD) fez o PS provar do seu próprio veneno. Os habituais joguinhos de poder do extremo centro. Aqueles que cavam desconfiança nos eleitores e os afastam das coisas políticas.
quinta-feira, 29 de maio de 2025
Aceleração sem freios
Há um dado curioso na evolução recente deste indicador. Diz respeito ao facto de, contrariando a tendência registada até ao final de 2023, a variação dos preços - na perspetiva da avaliação bancária de imóveis - deixar de acompanhar a evolução da inflação. De facto, pela primeira vez, a uma estabilização dos valores da inflação em níveis mais baixos (a oscilar entre 2% e 3%) não corresponde uma estabilização dos valores da avaliação bancária, que disparam.
O efeito do aumento da procura na subida dos preços, com o contributo da descida das taxas de juro, surge assim como uma das hipóteses mais convincentes para explicar este desfasamento. Mas entra aqui também o incontornável efeito das medidas fiscais de incentivo à procura adotadas pelo governo da AD (a par da supressão dos escassos mecanismos de regulação do mercado), cujo simples anúncio foi suficiente - segundo os próprios agentes do setor - para uma aceleração do aumento dos preços ao longo de 2024.
Sublinhe-se, uma vez mais, que o problema não se resume, como continuam a tentar convencer-nos, a uma mera falta de oferta, na tentativa de escamotear que as procuras são hoje muitas e diversas, incluindo procuras especulativas internas e externas (que encaram as casas como meros ativos de investimento) e que, pela sua própria natureza, são potencialmente inesgotáveis. Para que assim, também de forma recorrente, continuem a rejeitar-se quaisquer medidas de regulação do mercado, sem as quais não será possível ultrapassar a atual crise de habitação. Aqui e lá fora.
Saber elogiar a fronteira
Alguém traduza este elogio já com uns anos: “A fronteira é o escudo dos humildes [os fortes são fluidos] (...) uma fronteira reconhecida é a melhor vacina contra a epidemia dos muros”.
quarta-feira, 28 de maio de 2025
Mais que uma dúzia
terça-feira, 27 de maio de 2025
Onde estavam?
Parafraseando uma canção infantil, é um comentário muito engraçado. Num país há muito escandalosamente dominado pela direita nos espaços de comentário político (como mostra um estudo recente do MediaLab-ISCTE), é espantoso que apenas agora - quando a direita tem maioria no parlamento - alguém venha exigir um reflexo da representação parlamentar na constituição de painéis de opinião, advogando - nestes casos - o silenciamento.
Para quem há muito denuncia o défice de pluralismo na comunicação social (que não é exclusivo das televisões), impeditivo de um verdadeiro debate e da existência de contraditório, nunca esteve em causa a supressão de opiniões. Mas antes, como é óbvio, um maior equilíbrio e, sobretudo, a garantia de representação e acesso ao confronto entre diferentes pontos de vista e perspetivas, sejam quais forem as configurações parlamentares saídas de eleições.
Fotografar a economia política internacional
Continuar a perguntar
Em 2008, considerava-me um europeísta crítico, alimentando ilusões sobre uma UE que reconhecidamente estava a destruir a social-democracia.
segunda-feira, 26 de maio de 2025
Vazio despovoado
“Precisamos de recentrar o PS nas pessoas”, afiançou Marina Gonçalves no Público.
Vá lá perceber-se porquê, lembrei-me de uma passagem de um poema de Natália Correia, brilhantemente popularizado por José Mário Branco, “somos vazios despovoados de personagens do assombro”.
A social-democracia é hoje uma das expressões do “governo do vazio”, como escreveu o teórico político Peter Mair, esvaziada que foi pelo consenso euro-liberal com décadas, agora militarista até à medula.
Ainda tinha ilusões europeístas, em 2008, quando escrevia no Negócios, e já assinalava esse esvaziamento. Um exemplo entre tantos outros da sua expressão nacional: dos menores parques habitacionais públicos da UE, em percentagem do parque habitacional, num país com um dos menores níveis de investimento público, em percentagem do PIB.
O fim da linha é esta conversa sobre as “pessoas”, totalmente desprovida de substância social, programática, de tudo. José Luís Carneiro será só a encarnação da “condição póstuma” de um P sem S e em breve sem P, mudo, sem vontade. Nada, zero, fim.
domingo, 25 de maio de 2025
Substância no tempo
Os resultados eleitorais no concelho e na península de Setúbal revelam a verdadeira chave de leitura destas eleições. Uma leitura que tem de ir para além do imediato. Tem de compreender e integrar as tendências de fundo. Deve articular-se com a mudança das placas tectónicas eleitorais nos países ocidentais. Dos EUA, ao resto da União Europeia (...) A pior coisa que se pode fazer, por ser intelectualmente arrogante e um total erro de análise, é culpar os eleitores (...) PS, a AD e o resto dos partidos “responsáveis” continuam a tratar a UE como uma “vaca sagrada”, ao ponto de António Costa ter trocado a sua maioria absoluta de 2022 por um lugar à frente do, cada vez mais patético, Conselho Europeu.
sábado, 24 de maio de 2025
Obrigado, Sebastião Salgado
Vós sois o sal da terra. Mas se o sal se tornar insípido, com que se salgará? Já não serve de nada: só para ser atirado fora e pisado pelos homens.
sexta-feira, 23 de maio de 2025
A universidade tem de ser popular
O fim da solidariedade. O fim da igualdade
Validade e poder
quinta-feira, 22 de maio de 2025
Ponto de situação
Bom aluno de cada vez piores mestres, como diria o saudoso Medeiros Ferreira, o Público, tem, pelos vistos, acompanhado nas últimas semanas, quiçá com um ou dois dias de atraso, a imprensa ocidental lá mais para cima e para o lado, a dita de referência, na sua mudança sobre o genocídio.
Sempre uma fé nos peitos
quarta-feira, 21 de maio de 2025
As histórias não acabam
Sabemos tudo acerca do delicado tecido de normas e reciprocidades sociais dos ilhéus de Trobriand e acerca das energias psíquicas envolvidas nos cultos de carga da Melanésia; mas nas nossas histórias, a determinada altura, esta criatura social infinitamente complexa, o homem da Melanésia, torna-se o mineiro de carvão inglês oitocentista que leva espasmodicamente a sua mão à barriga e reage a estímulos económicos elementares. À perspetiva espasmódica contraporei a minha própria perspetiva. Em quase todas as ações da multidão oitocentista é possível encontrar alguma noção legitimadora.
terça-feira, 20 de maio de 2025
Rir, chorar, lutar
segunda-feira, 19 de maio de 2025
Notas com precisões
O fascismo vem mesmo por arrasto. Se as direitas funcionam por incessante repetição e se têm a hegemonia, então é caso para dizer que há algo a aprender com tal modo de operar.
Sim e não
domingo, 18 de maio de 2025
Como se o blogue fosse um diário
sábado, 17 de maio de 2025
Dia de reflexão, dias de luta
É a primeira vez que coloco fotos de crianças vítimas da fome no blogue. Mas o infanticídio é parte do genocídio, em 1945 e em 2025. Não podemos virar o olhar, deixar de ver.
Reflexão sonora
sexta-feira, 16 de maio de 2025
Em busca do poder de compra perdido
A inflação deixou de ocupar os telejornais, mas não saiu da nossa vida. Apesar da taxa de inflação já ter voltado aos valores a que nos habituámos, a subida dos preços e o custo de vida são, a par da saúde, as principais preocupações dos portugueses, de acordo com o último Eurobarómetro do Parlamento Europeu. O preço do azeite ou dos ovos e o custo da habitação continuam a ser problemas que preocupam a maioria das pessoas.
Quando se discute o impacto da inflação na vida das pessoas, discute-se o poder de compra e a evolução dos salários “reais”, isto é, o aumento dos salários descontando a inflação. Podemos receber um aumento e passar a ver um valor mais alto no recibo de vencimento, mas se os preços dos produtos que costumamos consumir estiverem a aumentar, isso não significa que consigamos comprar mais quantidades – por outras palavras, podemos não ganhar poder de compra.
Em Portugal, o salário médio real registou uma quebra de 4% em 2022, quando a inflação atingiu o pico, mas a tendência inverteu-se depois: subiu 2,3% em 2023 e 3,8% em 2024. Estes dados foram referidos tanto pelo governo anterior como pelo atual, que os apresentaram como um sinal de melhoria das condições de vida e de sucesso da política económica. Na análise económica, a tendência tem sido a de considerar que as pessoas estão confusas e não têm capacidade de avaliar se o seu salário está a acompanhar os preços na economia – algo a que os economistas chamam “ilusão monetária”. No entanto, há motivos para pensar que a forma como medimos a inflação pode não corresponder à evolução do custo de vida real.
Como medimos o custo de vida?
É preciso começar por perceber o que é que medimos quando medimos a inflação. O indicador usado para medir a inflação é o Índice de Preços no Consumidor (IPC), que é construído com base num cabaz de consumo médio: um cabaz que procura representar, em média, quanto é que as pessoas gastam do seu orçamento em cada tipo de produto ou serviço. Partindo desse cabaz, as autoridades estatísticas recolhem informação sobre os preços de inúmeras variedades de cada tipo de produto ou serviço, desde fruta, arroz e carne ou peixe a roupa, eletrodomésticos, pacotes de telecomunicações, etc.
Para calcular a evolução média dos preços – a taxa de inflação da economia –, o que se faz é atribuir um peso a cada um destes produtos que procura espelhar o peso que, em média, têm no consumo das famílias. Imaginemos que, num dado ano, os iates passam a custar o triplo. Embora se trate de um grande aumento de preço, a esmagadora maioria das pessoas não os adquire normalmente, pelo que não terá grande expressão no indicador da inflação. Variações nos preços da comida, por outro lado, têm um impacto muito maior, porque fazem parte do consumo da maioria das famílias.
Este cálculo é útil, mas tem limitações que o impedem de captar dinâmicas relevantes sobre o poder de compra. O principal problema é que, quando nos focamos demasiado na média, podemos acabar por subestimar as diferenças que existem na sociedade. No caso do custo de vida, há duas dimensões que fazem com que a mesma taxa de inflação signifique experiências muito diferentes para pessoas diferentes: o nível de rendimento e a relação com a habitação.
Quem paga o quê?
O “cabaz médio” usado para medir a inflação não tem em conta que os padrões de consumo são diferentes consoante o escalão de rendimento das pessoas. Isto é importante porque nem todos os preços sobem ao mesmo ritmo e algumas subidas de preços afetam mais uns grupos do que outros.
Normalmente, as pessoas com menos rendimentos gastam uma percentagem maior do seu salário em produtos essenciais – energia, alimentos, etc. Foi precisamente nos bens essenciais que se registaram os maiores aumentos de preços. Em 2022, no início do surto inflacionista, a inflação foi de 7,8%, mas os preços da energia aumentaram 23,7% e os alimentos aumentaram 12,2%. Nos anos seguintes, a tendência atenuou-se, mas não se inverteu. O impacto pesa mais na carteira de quem gasta uma percentagem maior do seu rendimento nos bens essenciais.
Além de ser verdade que nem todos os preços sobem ao mesmo ritmo, mesmo dentro do mesmo produto, nem todas as categorias encarecem ao mesmo ritmo. Imaginemos o exemplo do leite: a estatística diz que o preço do leite aumentou, por exemplo, 10% num ano; no entanto, quando vamos ao supermercado, não há apenas uma categoria de leite, mas sim várias marcas diferentes. Na maioria dos produtos, existem marcas de fabricante, mais caras, e a marca branca, normalmente mais barata.
Isto é relevante porque, nos últimos anos, há dados que sugerem que houve subidas mais acentuadas dos preços nas categorias que eram mais baratas à partida – um fenómeno denominado cheapflation. Uma análise recente do Banco de Portugal, que confirma este fenómeno nos supermercados nacionais, concluiu que a maior diferença foi registada em produtos como a carne, peixe, leite, queijo e ovos. Ou seja, alimentos que fazem parte do pequeno-almoço, almoço e jantar da maioria das pessoas.
Novamente, esta tendência tende a penalizar quem ganha menos: quem tem salários mais altos pode deixar de consumir produtos mais caros e trocá-los pelo equivalente da marca branca para se proteger do impacto da inflação, enquanto quem ganha menos, à partida, já tende a escolher os produtos mais baratos. Ao representar a evolução média dos preços na economia, o IPC não oferece informação sobre a variância dos preços – ou seja, sobre quais os produtos (ou as marcas) que estão a encarecer mais do que os outros.
Ter casa custa
A segunda dimensão, particularmente relevante nos últimos anos, é a da habitação. Em relação à habitação, a maioria das pessoas encontra-se numa de três situações: ou têm casa própria e já a pagaram, ou têm casa e estão a pagar o empréstimo, ou arrendam. No caso dos dois últimos, a prestação paga ao banco ou a renda paga ao senhorio são muitas vezes a principal despesa do mês.
Seria de esperar que esta despesa fosse particularmente relevante para o cálculo da inflação. Contudo, o cabaz do IPC não inclui a despesa com prestações. Quando a prestação aumenta, esse aumento do custo não entra para o indicador da inflação, mesmo que represente um aumento muito significativo do custo de vida. E embora se inclua uma categoria que corresponde às rendas das casas, esta tem um peso muito pequeno em Portugal: o IPC assume que a despesa com a renda, a água, a eletricidade e o gás ronda apenas 10% do orçamento familiar. Isto acontece porque a percentagem de pessoas que arrenda casa é reduzida (22,2%) face à de quem tem casa própria (77,8%) e, por isso, não paga renda.
Este aspeto tem implicações bastante relevantes para a forma como se mede o impacto dos preços da habitação. No caso de quem arrenda, a despesa com a renda costuma ter um peso muito maior do que aquele que é assumido no cálculo do IPC. E, no caso de quem tem casa própria e a está a pagar, quando uma subida das taxas de juro leva a um aumento das prestações dos empréstimos com taxas variáveis (que representam cerca de 90% dos créditos em Portugal, um dos valores mais altos da Europa), este não é refletido no índice usado para medir a inflação.
Ao não incorporar os custos associados às taxas de juro, o IPC não permite avaliar o impacto da política monetária na carteira das pessoas. O custo do crédito é uma componente essencial do custo de vida. Na verdade, a prestação da casa é, para uma parte significativa das pessoas, a principal despesa do mês e um dos principais fatores que definem o seu custo de vida. Desde 2021, a prestação média para aquisição de habitação em Portugal aumentou 80%, passando de menos de €250 para mais de €440.Não é possível avaliar o poder de compra das pessoas sem ter em conta este custo.
As limitações do indicador da inflação estão longe de ser meros detalhes técnicos. Na verdade, têm um impacto significativo na nossa vida: o IPC é o referencial usado nas negociações salariais entre empresas e sindicatos e na atualização das pensões e de outros apoios sociais. Se o indicador subestima o aumento do custo de vida, leva a aumentos mais baixos do que os que seriam necessários para compensar a subida dos preços.
A forma como medimos a inflação pode ajudar a explicar a discrepância entre as estatísticas e a experiência de boa parte das pessoas, para quem a crise da habitação está a agravar significativamente o custo de vida e a deixar cada vez menos rendimento disponível no fim do mês. Portugal foi o país da OCDE onde o fosso entre os salários e os preços das casas mais aumentou na última década. Não é de estranhar que o custo de vida não tenha saído do topo das preocupações das pessoas. Estranho é achar que estão simplesmente erradas, sem procurar perceber os motivos.